Mulheres da Nação 2025: mês de março destaca elas, que são potência
- Maria Isabel
- 4 de jun.
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Mestra Maria Isabel regeu a festa e a apresentação das Mulheres da Nação, em uma celebração que une, articula e reconhece este grupo composto sobretudo por mulheres.

O mês de março de 2025 foi marcado por uma celebração especial no Maracatu Nação Pé de Elefante: o evento "Mulheres da Nação", que homenageia e evidencia o protagonismo feminino dentro do grupo. Sob a regência da Mestra Maria Isabel, a festividade reuniu batuqueiras, dançarinas e integrantes em um dia repleto de atividades que ressaltaram a força e a contribuição das mulheres na trajetória do maracatu.
O protagonismo feminino no maracatu e na cultura popular
Historicamente, as mulheres desempenharam papéis fundamentais no maracatu, especialmente nas alas de dança e nos bastidores. Embora, por muito tempo, as posições de liderança fossem predominantemente masculinas, essa realidade vem se transformando.
Grupos como o Maracatu Leão Coroado e o Encanto do Pina, do Recife, têm reconhecido e promovido o protagonismo feminino, com mulheres assumindo cargos de destaque e liderança. Na Paraíba, o protagonismo feminino sempre esteve presente em diversos grupos tradicionais, com mestras ocupando naturalmente posições de liderança e referência.
No coco de roda e na ciranda, por exemplo, nomes como Vó Mera, Mestra Ana do Coco, Mestra Cida e outras mulheres à frente de grupos do litoral ao interior evidenciam essa presença viva e potente. Enquanto isso, no Cavalo Marinho, destaca-se Mestra Tina, que também é mestra de ciranda e de capoeira.
A história do “Mulheres da Nação”
O movimento "Mulheres da Nação", anteriormente conhecido como “Mulheres desta Nação”, começou a criar suas raízes quando Mestre Fernando, líder do Maracatu Nação Pé de Elefante, cedeu a regência da bateria, em ocasiões específicas, para Harue Tanaka, batuqueira, docente, pesquisadora, escritora e militante.
Essa iniciativa foi significativa, pois abriu espaço para que mulheres assumissem papéis de liderança no grupo. Em 2023, o evento ocorreu pela primeira vez no formato atual: ensaios e uma apresentação conduzidos por uma regente mulher, com todas as batuqueiras femininas da Nação. Em 2024, devido ao afastamento de Harue por problemas em seu ombro, a regência ficou a cargo da então batuqueira, Maria Isabel.
E o ano de 2024 reservava ainda muitas surpresas. Durante as festividades da tradicional Festa dos Mestres, em Alhandra, Maria Isabel de Oliveira Franco foi consagrada Mestra da Nação, ao lado do Mestre Fernando Trajano. A cerimônia, conduzida por Pai Beto de Xangô, aconteceu em novembro.
Relembre esse momento tão encantado e cheio de significados para a Nação: a consagração da Mestra Maria Isabel na Festa dos Mestres de Alhandra!
Mais do que um reconhecimento simbólico, essa consagração representa uma virada significativa: a afirmação do protagonismo feminino em um território historicamente marcado por lideranças masculinas.
Mulher negra, de terreiro, batuqueira, regente e coordenadora da Nação, Maria Isabel constrói sua jornada com coragem, fé e um compromisso profundo com a preservação e a renovação das tradições afro-brasileiras.
A celebração das Mulheres da Nação em 2025
A Festa das Mulheres da Nação, em sua edição de 2025, foi um ato de cuidado coletivo, celebração e fortalecimento. Realizada na sede do Maracatu Nação Pé de Elefante, na Vila Sanhauá, em 29 e março, a celebração foi inteiramente pensada, organizada e conduzida por e para as mulheres da Nação, mas de portas abertas para receber outras mulheres da cidade, especialmente das comunidades do entorno e de outros grupos de maracatu.
Um espaço criado com amor e escuta, onde o protagonismo feminino se manifesta em cada detalhe: na articulação, na troca de saberes, no acolhimento e na alegria de estar juntas. Sob a idealização e coordenação de Maria Isabel, Mestra da Nação, a programação foi construída de forma horizontal, com a participação ativa e igualitária da maioria das integrantes.
Cada mulher pôde contribuir com suas ideias, desejos e talentos. Essa escuta coletiva moldou uma programação diversa, potente e cheia de afeto, revelando a força de uma Nação que ressoa no ritmo da colaboração e do pertencimento.
Programação completa, começando pelo Acolhimento
As participantes formaram uma roda, fecharam os olhos e foram envolvidas pela voz das batuqueiras Edeuza e Clara, que entoaram os trechos das músicas:
Vim aqui para saudar
Força Feminina
Essa Força delicada
Mãe que nos ensina
(Força Feminina, de Dan Sonora)
—
A mão que bate o tambor é feminina
A mão que bate o tambor é feminina
E a força da nossa voz ecoa firme e veloz
Mostrando que o amor em nós nunca termina
(Nossa Voz, de Camila Trindade)
—
Eu saúdo a mulher que fui
Eu saúdo a mulher que sou
Eu saúdo a mulher que posso ser
Pra crescer, me fortalecer
(Eu saúdo a mulher, de Juliana Ribeiro)
Oficina de Costura com Lucimary Albuquerque
A costura é arte, técnica, expressão e também pode ser ferramenta de autonomia. Na oficina de saias-envelope ministrada por Lucimary Albuquerque, batuqueira da Nação, geógrafa, professora, designer de interiores e costureira profissional, as mulheres puderam transformar tecido em talento e potência.
Ao longo da manhã, as participantes escolheram seus tecidos, moldaram seus estilos e costuraram suas próprias peças, em um ambiente de partilha, conversa e apoio mútuo.
Almoço
Em respeito ao esforço das mulheres na organização do evento, que já estavam sobrecarregadas com a organização da festa, os homens ficaram responsáveis pelo preparo do almoço, que foi apreciado por todos.
Oficina de Dança do Ventre com Thaismary Ribeiro
Dançarina versátil, mestre em dança pela UFBA, professora, oficineira da corte e batuqueira, Thaismary conduziu uma oficina que promoveu a autodescoberta e valorização dos corpos das participantes por meio da dança do ventre.
Em cada novo passo ensinado e aprendido, Thaismary guiava não apenas os gestos, mas também um processo de autoconhecimento. A dança foi vivida como expressão de força, sensualidade e afeto, um espelho do que cada mulher carrega dentro de si, muitas vezes em silêncio.
Ao final, não era só o corpo que dançava: era o grupo inteiro vibrando junto, reconhecendo no coletivo uma força que também é íntima, transformadora e plena de axé.
Oficina de Interpretação Intuitiva com Tathy Wolf
Em um círculo de escuta e acolhimento, a cantora, compositora, poetisa premiada e batuqueira Tathy Wolf conduziu uma vivência intensa e profunda por meio da sua Oficina de Interpretação Intuitiva, parte do projeto autoral Vozes Ancestrais – Voz da Alma. Ali, a proposta era clara: soltar a voz, sentir o corpo, resgatar a liberdade do canto que habita em cada mulher.
Através de exercícios de respiração, improviso e expressão vocal e corporal, as participantes foram sendo guiadas por uma trilha de afeto e memória. Tathy incorporou canções da artista Ekena, cuja obra potente reverbera os dilemas, forças e sensibilidades da mulher contemporânea.
As músicas abriram espaço para que emoções aflorassem, e muitas mulheres se emocionaram ao se reconhecerem naquelas letras, e silêncios foram preenchidos por vozes que se descobriam.
Ao final da oficina, um momento simbólico e comovente tomou conta da sede: a primeira homenagem à Mestra Maria Isabel. As mulheres se reuniram em roda e, sob a condução sensível de Tathy, entoaram juntas a canção Andança, eternizada na voz de Beth Carvalho.
A emoção transbordou no canto coletivo, a música se mostrou como uma forma de agradecer, com a alma, a Mestra Maria Isabel, que vem trilhando um caminho de entrega e inspiração na Nação Pé de Elefante, com muito amor, fé, disciplina e generosidade.
A homenagem seguiu com a apresentação de uma toada escrita por Kaeliny Costa, batuqueira da Nação, especialmente para ela. E, como símbolo de respeito e confiança, Maria Isabel foi presenteada com um apito, instrumento de liderança no maracatu, adornado com um cordão trançado à mão por Lau Capym.
Um gesto que reafirma o lugar de afeto, força e comando que a Mestra conquistou com verdade, e que agora habita as vozes de todas que seguem com ela.
Apresentação
Encerrando o dia, aproximadamente 25 mulheres da Nação se apresentaram, tanto na corte quanto na bateria, tocando agbês, caixas, gonguês e tambores. Sob a regência da Mestra Maria Isabel, que irradiava energia e conexão com suas raízes, a apresentação foi um testemunho do vigor, do protagonismo feminino e da presença das mulheres no maracatu paraibano.
Foi então que aconteceu a segunda e última parte da homenagem das mulheres da Nação à Mestra Maria Isabel, um momento cuidadosamente guardado em segredo. Com ensaios discretos e muito carinho, as batuqueiras prepararam a musicalização de uma toada escrita por Edeuza Mola, batuqueira da Nação.
A canção reverencia os mestres e mestras, as mulheres encantadas e protetoras Maria do Açaís, Maria do Peixe, a Jurema Sagrada e o maracatu da Paraíba. Uma toada em reconhecimento à ancestralidade, à força feminina e ao poder da terra.
Ao final da apresentação, Harue pediu licença à Mestra. Em seguida, as batuqueiras formaram uma roda e, com o coração na boca, entoaram a toada de Edeuza como um gesto coletivo de afeto, reconhecimento e gratidão à Mestra e a todas as mulheres que fazem parte da Nação.
Além da programação de atividades, Edeuza preparou lembranças especiais para cada oficineira, em sinal de agradecimento pelo empenho e pela generosidade em compartilhar seus saberes.
A casa foi cuidadosamente ornamentada pelas próprias mulheres com folhagens e flores diversas, de modo a criar um ambiente vivo e acolhedor. Entre as lembranças entregues a cada mulher presente, sementes de jurema e girassol, embaladas em envelopes delicadamente confeccionados com frases como: “Tenha orgulho da mulher que você escolheu ser!”. Um gesto feito pelas batuqueiras e dançarinas da Nação, em especial Edeuza e Darlanne.
Cada mulher pôde também levar para casa uma muda de babosa, doadas com afeto por Lucimary, e assim reforçar os laços entre cuidado, natureza e força feminina.
O "Mulheres da Nação 2025" reafirmou o papel central das mulheres no Maracatu Nação Pé de Elefante, celebrando suas histórias, talentos e a contínua construção de um espaço mais inclusivo e representativo na cultura popular brasileira.
Com Maria Isabel, o maracatu ressalta sua força enquanto expressão coletiva, espiritual e política. A Nação Pé de Elefante segue sua batida com ainda mais potência, guiada agora também por uma mulher que carrega em si os saberes do baque virado de Nação Nagô, do axé, da resistência e do cuidado.
Que sua liderança continue ecoando, fortalecendo e inspirando tantas outras mulheres que, como ela, fazem da cultura popular um lugar de pertencimento, força e transformação.












































































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